quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Fünf

Quando eu vivia em Fátima ia à missa aonde alguns membros da Comunidade Vida e Paz também iam.
Eu, na rebeldia da adolescência, citava a bíblia para ficar no fundo da Igreja, justificando com as escrituras a minha pouca vontade de estar na missa (eu só me rio com os meus argumentos da altura, mas eram geniais!).
Eles, quase sempre, chegavam atrasados e, por isso acabávamos por ficar juntos. Coisas houve que, apesar da tal rebeldia, nunca me escaparam. Poucas eram as pessoa que no momento de partilhar a paz se viravam para eles. Eles partilhavam a paz entre eles e eu, por dois motivos, também partilhava a paz com eles. Um porque simpatizava com aquele grupo de pessoas em recuperação (havia lá um homem de olhos azuis que me tocava a alma [sem poucas vergonhas, que estávamos na missa]). E o outro argumento era simples: mais de metade da população de Fátima era uma cambada de hipócritas, eu partilhava a paz coma quele grupo, mas não partilhava a paz com os narizes empinados que não partilhavam a paz com o grupo. Haja devoção! (deles e minha que me "vingava" pelos outros não dando a paz aos engravatados)

Com esse momento de paz eu acabei por lhes chamar de amigos. Não sei os nomes, nunca fomos além de um olá (caso chegassem antes do início da missa), do momento da paz ou de um adeus a correr no fim da missa. As minhas colegas gozavam comigo, mas ainda hoje eu não quero saber, eles eram meus amigos.
Não sei o que será feito deles. Eu não vou àquela igreja desde Junho de 2000. A minha esperança é que todos eles estejam bem. Reintegrados, saudáveis e felizes. Principalmente o tal senhor dos olhos azuis. Tinha um olhar de pessoa boa que teve o azar de escorregar na vida, mas que se notava que não queria fazer mal a ninguém no mundo.

A minha esperança é de muitos outros. Dos que precisam de ajuda e dos que precisam de ajuda para ajudar. Pois por muita boa vontade que haja, se não houver pão... toda a gente sabe que não há vida nem paz.

Assim, na onda de fazer o Calendário de Advento, não esquecendo a solidariedade, dedico o dia à Comunidade dos meus amigos. Assinalando que nos dias 20 a 22 de Dezembro na Cantina 1 da Universidade de Lisboa se vai realizar 25.ª Festa de Natal da Comunidade Vida e Paz. E "roubando" as últimas linhas do anúncio da festa:

A Comunidade apela a todos os portugueses que contribuam através de meios monetários, géneros alimentares ou outros – para mais informações contacte a instituição através do número 218460165 ou do e-mail geral@alvalade.cvidaepaz.pt



2 comentários:

teresa disse...

Quanto a esta comunidade, acrescento que fiquei impressionada, quando a minha filha mais nova integrou um grupo de trabalho (reportagem em vídeo) da faculdade e fizeram, com alguns elementos da "comunidade vida e paz" uma ronda diária para distribuição de roupa, alimentos, a par de entrevistas a alguns técnicos responsáveis: gostei da vertente de integração dos sem abrigo na vida profissional e todo um trabalho de acompanhamento, não se limitam a fornecer alimentos, mas sim a trazer dignidade a quem precisa de refazer a vida, ganhando autonomia.

Luísa disse...

Na minha opinião, Teresa, os da comunidade são defensores da máxima "se te pedirem um peixe, ensina-os a pescar". E isso é que é o mais correcto.
Porque azar... qualquer um de nós pode ter na vida. Ter a coragem de pedir ajuda, nem todos têm. Mas quando têm... também precisam de alguém que lhes dê a cana de pesca.
E como eu via aqueles homens a entrar na igreja cada semana com melhor aspecto. Alguns comecei a vê-los muito taciturnos e, com o tempo, tinham os olhos mais brilhantes, já sorriam, já brincavam com os outros...

Isso na altura deixava-me feliz, pois eu era uma adolescente insuportável, mas ninguém pode dizer que eu não tinha sensibilidade. Ter tido esta experiência em garota dá-me mesmo esperança e faz-me acreditar muito nesta comunidade.