sábado, 8 de fevereiro de 2020

Carona virus

Eu não sei o que se passa na empresa em que trabalho. Tenho dias em que me pergunto como é que ainda não houve uma tragédia ou como é que ainda não perdemos clientes ou sei lá o quê.
Os empregados bons estão a sair como ratos a abandonar um navio que se está a afundar. E desta vez eu consigo compreendê-los e a imagem que usei não é para ser vista como algo negativo. Cada um por si, porque ninguém os apoia.

Isso faz com que uns sejam sobrecarregados, que entre gente aos molhos todos os meses… mas… depois… só entra merda. Sim, não há palavra mais clara do que esta para catalogar os espécimes que temos recebido.

Nos perdidos e achados não tem entrado muita gente, é mais no check-in. Eu tinha andado ausente, enfiada nas catacumbas (os perdidos e achados não têm luz natural) e não tinha noção do que se passava fora da Caverna. Mas agora que me soltei das amarras vi que as sombras são afinal… sombras muito escuras...

Em coisa de duas semanas aconteceu de tudo, ouvi de tudo e só aguento porque adoro o que faço e no fim do mês já vou de férias!!!

Tirando facto de haver muita canalha nova (idade) a pensar que sabe mais do que eu, tirando o facto de haver muita besta nova (ainda no tempo de prova) a tentar ensinar-me o trabalho (oh otários, não é porque não me vêm muito no check-in, que eu não sei o que faço), eu não suporto o facto de eles serem tão ignorantes e não mostrarem o mínimo de interesse por… nada… nenhum tema...

Aqui ficam algumas pérolas:

Passageiro chega a perguntar como é no dia seguinte já que estão a pensar fazer greve nas torres de controlo ou não sei o quê em França, resposta do gajo:
-ah nós não sabemos se a greve nos afecta ou não. Vocês tem que vir amanhã e ver. 
[Esclarecimento: pelo menos um dia antes nós sabemos se os nosso aviões vão ser afectados por greves ou não; se soubermos, o passageiro é informado e recebe uma alteração da viagem o mais adequada à situação (à parte: eu tinha dito que ele não prestava). Se eu não me tivesse metido no caminho o pobre homem tinha tido um ataque cardíaco!]

O passageiro deve ter perguntado se havia dificuldades para fazer o transbordo em Amesterdão (é uma pergunta recorrente, devido ao curto tempo que há entre aterragem e embarque). Resposta da analfabeta:
- Não se preocupe. Amesterdão é um aeroporto pequeno. 
Explicação: a técnica é dizer aos passageiros que se devem encaminhar o mais rapidamente possível para a nova porta de embarque. Principalmente se o tempo de transbordo for inferior a uma hora. Além disso, Amesterdão NÃO é pequeno! Antes pelo contrário é dos maiores da Europa.

Ontem foi a gota de água no check-in...
Os novos têm que ter uns dias de acompanhamento. Há dois ou três dias estive com um miúdo (18anos) e ele ouviu-me, perguntou-me e ainda me agradeceu o facto de ele lhe ter dado umas dicas extra, retiradas de umas notas que eu fiz quando comecei a trabalhar lá. No fim, rematei como remato sempre: qualquer dúvida, pergunta, pergunta, pergunta.
Já ontem tive uma estúpida que… pensa que é a última bolacha do pacote.
Além de não ouvir o que eu lhe disse e fazer o que lhe apetecia, quando eu lhe disse que perguntasse sempre que precisasse, ela rematou com a resposta: - Eu não pergunto, porque nunca mais aprendo. O meu pensamento foi só um "boa sorte com tanta arrogância".

No entanto, ela cometeu um crime de lesa-majestade comigo… Teve a ousadia de dizer que Português era igual a Espanhol. E depois de eu negar,  ela decidiu insistir  e insistir e dizer "quando se estuda a língua sabe-se que são quase iguais". Eu inspirei muuuuuuuito fundo para a resposta não me sair aos gritos e disse-lhe:
-Eu sei, eu trabalho num check-in, mas a minha formação é Linguística e Literatura Portuguesas! Ela ainda tentou insisitir (oh céus!), e eu disse-lhe que se calasse porque não queria discutir. O monte de esterco quis provar que era melhor e começou a dar palpites sobre como eu poderia dar aulas em vez de estar no aeroporto e já querer voltar ao seu conhecimento exímio de português diz-me que também tinha sido professora. Foi a minha deixa para acabar com a conversa parva: - Então o que fazes aqui a trabalhar? E o raio da russa calou-se finalmente.

Mas a cereja do bolo destas últimas semana é dos perdidos e achados. Um gajo que entrou há dias, andou à batatada sei lá onde. A polícia levou-o para a choldra, um dia ou dois para arrefecer as ideias. A empresa tem tentado contactá-lo. Sem sucesso. Fala-se em despedimento sem aviso. É que, quanto mais não seja, não se pode ter cadastro para trabalhar no aeroporto…

E pronto… é com isto que tenho que conviver… :/

* Na infância sempre ouvi falar do "avião do Carona". Acho que é daquelas piadas, que vão passando de geração em geração, relacionadas com uma família da terra (os Caronas são aos montes lá na aldeia). E deu-me para fazer esta associação de ideias contemporâneas, privadas, antigas, públicas num título parvo como tudo… :D :D

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