Há 11 Natais, preparava-me para vir de férias, quando três miúdas, irmãs órfãs, que viviam comigo, se agarraram a mim em desespero e me pediram para eu não vir de férias. Suplicaram-me que ficasse, mas eu, por inúmeras razões, não o podia fazer. Chorei o Natal todo. Enquanto o Papa abria Porta Santa, no Vaticano, para o ano Jubilar, eu só pensava nelas. Se estariam felizes lá com as freiras. A partir dessa altura comecei a achar o Natal ainda mais ridículo do que já achava e desisti de ver as notícias sobre os mais necessitados.
Confesso que nesta altura do ano só olho (ou pelo menos tento) para os brilhos das decorações. Fujo (ou tento) à realidade, quase que ignoro que há gente a precisar de ajuda. Posso parecer frívola, parecer insensível, mas não sou. É simplesmente a minha forma de me defender. É demasiado doloroso saber que as minhas meninas, apesar de muito amadas e protegidas pelas freiras, não têm pais que lhes valham. É triste saber que as prendas que elas recebem, quando recebem, são me segunda mão. E mais triste ainda é saber que eu não as posso ajudar todas, quer numa situação, quer noutra. Por esse motivo, tento olhar só para os dourados e vermelhos e deixar que estes dias de farra passem para depois olhar de novo para a realidade.
No entanto, hoje não escapei à dureza da vida. Quando me preparava para responder ao comentário do post de ontem, ouvi no telejornal uma notícia que me deixou triste. Muito triste.
Apesar de se estar em tempo de férias, as cantinas das escolas mantêm-se abertas. Só no Porto, há 1700 crinaças a benificiar do apoio prestado em 49 das 54 cantinas da cidade (se não falho no que ouvi).
A minha mãe virou-se para mim e disse que a situação lhe parece pior do que no seu tempo de menina. Tempo em que não havia fartura. Em que, para a maioria, onde ela estava incluída, não havia coisas 'supérfluas' como marmelada no pão, mas que havia sempre um naco de pão.
Não sei se é má gestão de recursos (a nível macro, como a construção de estradas e mais estradas ou de estudos de não-se-o-quê-que-depois-vai-ficar-na-gaveta, ou a nível micro, como optar por ter um carrão quando se pode andar de autocarro ou até mesmo a pé, comprar o telémovel ultima geração para o menino não-se-sentir-inferiorizado-quando-na-realidade-devia-era-aprender-o-valor-real-das-coisas) ou se é mesmo a crise. Mas que há algo de podre no reino da Dinamarca, lá isso há.
É assustador saber que há cada vez mais crianças que só têm a refeição quente que lhe dão na escola, não é?
Já não falando na necessidade de uma criança se alimentar bem para estudar como deve ser, ver as necessidades dos outros aumentarem é simplesmente assutador. Depois, tudo isto associado a esta época, acho que se torna tudo ainda mais gigantesco e grotesco.
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